Por Heron de Freitas Santiago
Esses dias me peguei imaginando como serei quando ficar velho e confesso que algo me perturbou.
Será que serei tão limitado com as novidades quanto as pessoas mais idosas da minha vida são hoje? Será que pedirei aos meus filhos para atualizar o hologramador (espero que exista um hologramador)?
O homem é um animalzinho singelo e, por mais que sejamos consumistas por natureza, quando nos damos por satisfeitos em relação a um processo, tendemos a nos apegar a ele, o que é perfeitamente natural. Afinal, aprender é humanamente desconfortável.
Por isso, quando meu neto tiver um iPhone vinte e sete, provavelmente ainda estarei apegado ao vinte, sugando cada suspiro de vida que ele tiver para não precisar trocá-lo.
A pergunta é: quando a atualização for necessária e meu novo aparato chegar, será que pedirei a alguém que alivie a dor de introduzi-lo na minha vida?
Difícil prever.
O ponto é que vivemos a eterna busca e manutenção da zona de conforto. Uma bela zona!
Por isso, creio que o iPhone vinte e sete (bem como qualquer nova tecnologia, ideologia ou conceito inovador) será um grande implante anal, e todos terão que tomar no cu pra assimilá-lo. Uns mais, outros menos, mas quem é velho já se fodeu bem mais e por muito mais tempo que o jovem; por isso, tende a sofrer mais também. Até existem velhos com pregas mais elásticas, mas a verdade é que uma hora o corpo tende ao cansaço, e cabe a quem é jovem ajudar o antigo a lubrificar-se, para que as limitações do corpo não sobrepujem à curiosidade imortal do espirito.
Isso ou a morte.
Até porque limitações tendem a corroer o brio que a suficiência capenga de cada um já não garante mais e se é preciso mostrar a bunda para obter ajuda, cabe a quem provém à assistência, pelo menos cobri-la com dignidade.
Foda.
Divagações à parte, quando minha amada mãe me perguntar sobre seu novo tablet ou meu pai sobre o e-mail dele que não funciona, serei mais paciente. Afinal, eles já tiraram minha mão de dentro do antigo videocassete muitas vezes, fora tudo que já nem me lembro que ensinaram como comer, andar, existir e me amaram acima de qualquer coisa nos meus piores tropeços.
E por fim, respondendo às perguntas que me fiz:
Descansarei bastante depois de morto. Então, que a cabeça fique jovem apesar do cansaço do corpo. E isso é sério; afinal, não quero tentar a sorte com os implantes.
Sobre o autor:
Heron de Freitas Santiago, lorenense, vinte e seis anos e é membro fundador da AJLL. Com uma criação diversa e repleta de boa vontade, cresceu sendo estimulado à pluralidade e à integração de conceitos. Tendo as artes plásticas como expressão artística primária, procura compor seus textos de forma libertária, sem amarras de qualquer espécie para traduzir com propriedade o que transborda de si.
Espaço reservado às produções dos acadêmicos da Academia Jovem de Letras de Lorena. Membros da AJLL: Beatriz Neves, Camila Loricchio, Danilo Passos, Gabriela Costa, Gustavo Alves, Gustavo Diaz, Heron Santiago, Isnaldi Souza, Jéssica Carvalho, João Palhuca, Julia Pinheiro, Lelienne Ferreira, Lucca Ferri, Samira Tito, Thiago Oliveira, Vânia Alves e Wagner Ribeiro.
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