As redes sociais se tornaram uma ferramenta poderosíssima de consumo e produção de informações, com grande poder de alcance e mobilização social. Faz dez anos que comecei a esboçar meus primeiros textos, jogá-los na rede para serem “pescados” por aqueles que desejassem empoderar-se do conhecimento acerca da pessoa com deficiência visual, das possibilidades de intervenção e dos recursos mais eficazes para a construção de uma educação inclusiva de qualidade.
Parece clichê, mas ainda hoje encontramos com certa frequência uma educação inclusiva pautada mais no processo do que no progresso desse aluno. Mas voltemos à internet…
Em 2008 criei um blog, que em princípio, serviu para que eu reproduzisse textos informativos sobre a temática do Braille e da acessibilidade. Na sequência, transformei o espaço num portfólio das ações que eu estava envolvida. Registrava em fotos e texto o andamento de cursos, minhas participações em palestras, seminários, aulas, simpósios, além de publicar experiências de sucesso no ensino da pessoa com deficiência visual. Entretanto, o blog começou a perder espaço dentro das minhas prioridades quando percebi que o alcance da informação estava sendo apenas entre os simpatizantes daquele assunto. Principalmente no que se refere à pessoa com deficiência, a informação precisa ser difundida também para quem não vivencia nem conhece essa realidade.
O Lorenense, então, surgiu para dar mais fôlego às minhas manifestações. Aqui posso escrever para um público que, diferente do que eu escrevia, não quer receitas prontas nem um manual de como lidar com quem não enxerga. A minha meta aqui é levar informação, mostrando o quanto podemos nos beneficiar das pequenas ações inclusivas no convívio com a diversidade, seja nas escolas, nas ruas, nos comércios, nas repartições públicas, enfim, todos juntos e misturados.
Grande parte da responsabilidade pela efetivação dos direitos das pessoas com deficiência é do poder público. Mas não só dele… a sociedade civil é tão protagonista quanto o governo quando, por exemplo, decide não tirar proveito ao estacionar seu veículo não credenciado em uma vaga exclusiva; quando não se faz de indiferente ao oferecer ajuda a uma pessoa que necessite, sem que o acontecimento seja visto como heroico; quando deixa de usar as calçadas como vitrines dos seus comércios; quando na ausência de sinalização sonora, tátil ou gestual, faz a mediação para que a informação seja compreendida.
A internet, por meio das redes sociais, tem sido palco de denúncias e reinvindicações por parte das pessoas com deficiência. É um espaço onde elas se sentem ouvidas e acolhidas, sem o risco de falarem para o vazio. E na onda do “curte quem quer”, ganha-se simpatizantes que, muitas vezes, não sabem como agir para ajudar.
Para ilustrar, trago o exemplo abaixo.
Algumas fabricantes de cosméticos não diferenciam o shampoo e o condicionador pelo formato/posição dos frascos. Algumas delas apenas colocam as informações nos rótulos, com a escrita na posição indicada: condicionador com a tampa para baixo e shampoo para cima. Seria conveniente se as empresas adotassem medidas simples de diferenciação dos frascos pela percepção tátil. Aí vem o peso das redes sociais: quando as pessoas passam a perceber o impacto de uma mudança, não basta o apoio pela curtida, mas uma mobilização no sentido de mostrar para a empresa o que ela poderia melhorar para que o produto seja acessível a todos. Uma carta, um e-mail ou um telefonema para o SAC servem como exemplo de cidadania.
É o fato de importar-se com a necessidade do outro e se mobilizar para uma transformação. Também é pelas redes sociais que as pessoas passam a perceber o quão uma deficiência não faz do outro o “patinho feio” da história. Por trás de uma tela, somos todos iguais, sem a deficiência como fator que inferioriza pela diferença. Porém, creio que manter um blog hoje, como uma vitrine pessoal, não propaga a informação com a intensidade que desejamos.
Conclui-se que a pessoa com deficiência é protagonista e precisa ser ouvida quanto às suas necessidades. Entretanto, as reinvindicações ganham mais força se apoiadas pela sociedade, tendo em vista o seu caráter coletivo e não somente as queixas individuais. É importante olhar para o outro e perceber que, mesmo em uma rede social, podemos fazer algo de concreto para colaborar com ações mais inclusivas e acessíveis. Pode não ser algo que atinja diretamente você, mas fará diferença para que as pessoas reconsiderem o valor e os esforços em prol da inclusão.
Luciane Molina é pedagoga, braillista e pessoa com deficiência visual. Possui pós-graduação em Atendimento Educacional Especializado pela Unesp (Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho) e em Tecnologia, Formação de Professores e Sociedade pela Unifei (Universidade Federal de Itajubá). Sua trajetória profissional inclui trabalhos com educação inclusiva, ensino do sistema Braille, da tecnologia assistiva, do soroban e demais recursos para pessoas cegas ou com baixa visão, além de atuar desde 2006 com formação de professores. Foi vencedora do IV Prêmio Sentidos, em 2011, e do IV Ações Inclusivas, em 2014, ambos pela Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo (SEDPCD-SP). Também é palestrante e co-autora do livro Educação Digital: a tecnologia a favor da inclusão. Atualmente, integra a equipe técnica da Secretaria Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência e do Idoso de Caraguatatuba (SEPEDI), com ações voltadas para a comunicação inclusiva, políticas públicas para pessoas com deficiência visual e Núcleo de Apoio às Deficiências Sensoriais.
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