Quando eu cheguei a Lorena, em meados da década de 50 do século passado, o Ricardo Hegedus tinha um estúdio fotográfico na rua Comendador Custódio Vieira, na altura dos fundos da casa da dona Zizinha Albano.
Na época, nós já conhecíamos o Ricardo e mamãe costumeiramente levava filmes para serem ali revelados. Por razões que desconheço, esse nosso amigo húngaro desfez-se da sua loja de fotografias e em seu lugar se instalou, no denominado “Foto Colúmbia”, um fotógrafo japonês, um certo senhor Giichi, casado com a dona Yoi e pai da Shizume e do Luiz Koji, amigo do Augusto Olavo Leite. E por falar nesse meu xará, filho do Zé Omar e da Celeste, foi ele que gentilmente me passou alguns desses dados sobre essa família oriental, num e-mail de alguns anos atrás.
Pois o senhor Giichi trabalhou durante muitos anos ali em seu estúdio, secundado pela sua mulher e pelo filho Luiz, que se revelou um atendente mal humorado. Também fui seu freguês naqueles tempos, tanto que o meu álbum de casamento, em branco e preto, foi magistralmente fotografado por ele.
Mas não é sobre isso que eu gostaria de falar. Apesar dos seus trabalhos fotográficos excepcionais, o senhor Giichi seria tão-somente um comerciante comum, um prosaico fotógrafo do interior valeparaibano, não fosse ele um sujeito diferente e original.
Eu me lembro de mim espantado, vendo-o transitar nos fins de semana no recente asfalto da rua principal da cidade. E não era um trânsito normal o dele, desses de passadas regulares e movimentos uniformes. Não, o senhor Giichi vinha rodando sobre patins, alado, os cabelos lisos e negros caindo sobre um rosto enigmático, de viseira, indiferente à estupefação dos passantes.
E não ficou aí esse senhor japonês em suas aparições inusitadas no centro urbano – segundo o meu xará, num tempo em que eram raras as bicicletas de marchas, ele já pedalava a sua pelas ruas e se mandava, novamente no dizer do Augusto Olavo, para as margens do rio Paraíba, a fim de fotografar os fins de tarde.
E por falar no fotógrafo que ele era, lembro-me que muitos anos mais tarde descobriu-se que ganhara, no passado, um importante prêmio no Japão pelas suas fotos. Lorena, tardia e timidamente, fez uma exposição fotográfica dos seus trabalhos no salão do Clube Comercial.
Uma cidadezinha no Vale do Paraíba, um certo senhor Giichi que nela patinava – simplicidade e originalidade convivendo num “flash” fotográfico da memória..
Olavo Rubens Leonel Ferreira é formado em Direito, Ciências Sociais e Pegagogia. É mestre em Educação. Lecionou na Universidade de Taubaté, na Faculdade de Direito de Lorena, nas Faculdades Integradas de Cruzeiro, nas Faculdades Teresa D´Ávila de Lorena e no Anglo Vestibulares. Escreve muito; tem uma meia dúzia de livros publicados e a maior parte do que produziu ainda é inédita. Durante alguns anos publicou crônicas sobre Lorena no saudoso Guaypacaré, dos seus amigos João Bosco e Carolina. Mora em São Paulo.
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