Há datas que são como armadilhas escondidas no calendário.
Silenciosas, esperam que um hecatombe
caia sobre elas, deixando sequelas,
tristezas, incertezas e mortes.
Durante trezentos e sessenta e seis dias
acompanhei seu silêncio, sua letargia.
E seu olhar doente, já divisando o longe,
não registrava mais minhas lágrimas.
Depois já sem sorte,
vi como é triste a palidez da morte.
Você sedada, totalmente emudecida,
entre os cabos que a ligavam à vida.
Às vezes, sinto o travo
das últimas palavras que não houve,
do último beijo que não lhe dei,
do último suspiro que não ouvi,
vencida pelo cansaço e sono, mãe.
Mas sei que em muitas noites está ao meu lado,
daquele modo silencioso, sem nada falar.
Apenas inventando um adeus (enquanto eu dormia),
que não nos condenasse ao desespero.
Não há tempo nem idade para aceitar a morte.
Sinto como é difícil o meu mundo sem a sua
presença forte; sob meus ombros pesam
as incertezas das raízes, de que agora
sou realmente órfã, mamãe.







