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Braille: símbolo da cegueira ou de cidadania?

04/02/2015

O Braille como símbolo da cegueira traz à tona uma realidade de isolamento cultural, marcada pela escassez de obras publicadas neste código e também ausência de professores que dominam esse conhecimento dentro das escolas regulares. São dois fatores muito preocupantes, principalmente nesse período que marca o retorno das atividades escolares Brasil afora.  
Pessoas com deficiência visual viveram durante séculos marginalizadas e longe do conhecimento científico e acadêmico. Somente com a criação do Sistema Braille, por volta de 1825, que essa realidade começou a ser transformada e ainda hoje merece nossa atenção.
 No Brasil, existem mais de 6,5 milhões de pessoas com deficiência visual, sendo 582 mil cegas e seis milhões com baixa visão, segundo dados do Censo 2010, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Quase duzentos anos depois da criação do Sistema Braille, ainda existe muita resistência e desconhecimento desse código, revelando um crescente descontentamento dos cegos que deixam de usar o Braille porque se sentem isolados e ainda mais limitados do que a própria ausência da visão. Ou ainda os que são forçados a abandonar esse aprendizado motivados por uma metodologia baseada em ‘improvisos’ com atividades orais, auxílio de copistas nas escolas ou ausência de adequação curricular pertinente a cada caso. E o que é mais alarmante, faltam livros didáticos em Braille. 
O Braille tem um papel muito importante na inclusão das pessoas com deficiência visual na sociedade, sendo a escola um dos espaços que deve favorecer a aquisição desse conhecimento. Há quem diga que o aprendizado do Braille é demasiado complexo para que o professor do ensino regular dê conta de ensinar o aluno cego ao mesmo tempo que ensina as demais crianças. Não importa se por receio ou comodismo, mas é preciso retirar do Braille o rótulo de exclusivo para que se popularize também entre as pessoas que enxergam, como símbolo de inclusão e cidadania.
Aprender Braille pode ser divertido, instrutivo, além de ser um conhecimento de lógica imprescindível ao desenvolvimento de habilidades cognitivas, motoras e sensoriais. Existem cursos de formação continuada específicos para orientar o professor no ensino do sistema Braille e no uso dos instrumentos de escrita em relevo. é importante que o professor compreenda que as atividades comuns poderão ser flexibilizadas para as pessoas cegas, assim como as atividades que priorizam os outros sentidos servem de referência para todos da turma e a aula fica muito mais interessante e agradável.
Com o passar do tempo novas formas de acesso à informação foram elaboradas para auxiliar estudantes cegos. Hoje, além do Braille existem audiolivros e softwares leitores de tela para computadores e dispositivos móveis. Porém o Braille não perde importância com a criação de novos formatos, sendo recurso indispensável para a alfabetização das crianças cegas, para que elas tenham contato com a ortografia e com a disposição do texto no papel. 
Assim como a criança que enxerga é alfabetizada e aprende a ler e escrever, a criança cega não traz o Braille consigo, como um assessório que reconhece nela a identidade por trás da sua cegueira. é preciso oportunizar esse aprendizado. Com o Braille as crianças cegas passam a ter acesso ao conhecimento, à cultura, ao lazer, à informação  e a partir desse conhecimento elas serão capazes de desenvolver a própria consciência, a pensar por si mesmas para construir seu futuro.

COLUNISTAS / Luciane Molina

Luciane Molina é pedagoga, braillista e pessoa com deficiência visual. Possui pós-graduação em Atendimento Educacional Especializado pela Unesp (Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho) e em Tecnologia, Formação de Professores e Sociedade pela Unifei (Universidade Federal de Itajubá).  Sua trajetória profissional inclui trabalhos com educação inclusiva, ensino do sistema Braille, da tecnologia assistiva, do soroban  e demais recursos para pessoas cegas ou com baixa visão, além de atuar desde 2006 com formação de professores.  Foi vencedora do IV Prêmio Sentidos, em 2011, e do IV Ações Inclusivas, em 2014, ambos pela Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo (SEDPCD-SP). Também é palestrante e co-autora do livro Educação Digital: a tecnologia a favor da inclusão. Atualmente, integra a equipe técnica da Secretaria Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência e do Idoso de Caraguatatuba (SEPEDI), com ações voltadas para a comunicação inclusiva, políticas públicas para pessoas com deficiência visual e Núcleo de Apoio às Deficiências Sensoriais.


braillu@uol.com.br

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