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COLUNISTAS / Em poucas palavras

Das almas generosas… Professor Nelson Pesciotta

23/10/2015

Por Graziela Staut

Não sei se vocês sabem, mas o prof. Olavo Rubens Leonel Ferreira está preparando uma biografia do prof. Nelson Pesciotta. Aliás, já está praticamente finalizada a produção de textos, segundo Olavo me contou. Acontece que durante a realização do trabalho, o querido Olavo me pediu uma colaboração, para que eu escrevesse algo sobre este grande homem, que é o prof. Nelson Pesciotta. Devido aos muitos compromissos, só consegui escrever “nos 45 do segundo tempo”, como dizem. Sei que parte do que relatei ainda pôde ser aproveitado pelo Olavo, mas não toda a história.

Por isso, peço licença agora pra “pegar emprestado” a coluna deste grande amigo para “falar” um pouquinho sobre ele:

Diante dos mais de 90 anos de uma das pessoas mais cativantes que tive o prazer de conhecer nesta vida, o tempo que pude desfrutar de sua amizade foi pouco, bem pouco… mas suficiente para ter a certeza de que o professor Nelson Pesciotta não é possuidor apenas de uma brilhante inteligência, mas, sobretudo, de um gigante coração.

Foi ele quem me deu a primeira grande lição de Jornalismo, na atuação prática, muito antes de me decidir pela graduação na área. Já estava acostumada à redação do Jornal Guaypacaré, de meus pais, desde a adolescência. Porém, todos os meus textos eram revisados e aprovados por eles. Pois bem. Quando meu pai adoeceu (aneurisma cerebral, em dezembro de 2003), minha mãe foi com ele para o Espírito Santo, onde tenho tios médicos que nos deram toda a assistência. Para fechar a edição especial de Natal, que era tradicional na cidade, ficamos eu e meu irmão Rodolfo.

Sem a supervisão direta deles, senti pesar a responsabilidade, mas não tinha noção de que era tanta ao redigir uma pequena nota, sobre um assalto que havia ocorrido no calçadão, na região central de Lorena. De acordo com o relato de quem presenciou, parecia um arrastão, pois estávamos às vésperas da data natalina, havia muita gente na rua e os criminosos foram entrando em vários estabelecimentos, assim como as pessoas corriam assustadas, sem saber o que acontecia. E eu escrevi isso no jornal, tomando o cuidado de escrever a palavra arrastão entre aspas, acreditando que fosse o suficiente para as pessoas entenderem que, de fato, não havia sido tão grandioso assim o ocorrido.

No dia seguinte à circulação da edição, estou eu na redação do Guaypacaré quando recebo a ligação do “Mestre”, como meus pais sempre se referiram a ele. E tomei uma baita de uma dura: “Como é que você escreve isso sem verificar direito o que aconteceu, menina?”

Expliquei minha intenção ao colocar “arrastão” entre aspas, pois foi este o relato que ouvi: “Parecia, mas não era. Acho que deu pra todo mundo entender”.

Ele então me repreendeu: “Nunca mais faça isso! Pense antes de escrever qualquer palavra, pois você não tem ideia do alcance de uma notícia como essa. Você poderia instalar um clima de pânico na cidade! Nunca tivemos arrastão por aqui!”

Quando ele desligou, eu estava muito brava. E chateada. Admito que pensei: “Que homem arrogante, mal educado!” … ainda mais porque ele não fazia ideia do quanto havia sido difícil para mim e para meu irmão concluir aquela edição.

Demorei anos pra entender que esta foi a primeira e uma das minhas mais importantes lições profissionais, pois nunca mais escrevi uma notícia sem ter certeza do que estava falando, sem averiguar, entender, detalhar, checar novamente…

Foram mais alguns bons anos até estreitarmos a relação. Até então, ele era o colunista do Guaypacaré, grande amigo de meus pais, a quem eu respeitava muito, principalmente por conhecer sua história de vida. Mas não fazia ideia da generosidade de sua alma. Foi então que em 2011 ou 2012, se não me falha a memória, fui pedir a ele um favor, para que me ajudasse na transferência do tratamento de saúde da minha mãe de Barretos para São Paulo, pois era mais perto e os prognósticos não eram bons. Estive algumas vezes na casa dele e fiquei surpresa com a receptividade daquele senhor cativante. Um bom humor, amabilidade e boa vontade que ainda não conhecia.

Ele, inteligentíssimo e queridíssimo, tinha bons contatos, pois seu saudoso filho Nelson Maurício (que possuía alma tão grandiosa quanto a do pai) ocupou cargo importante na Secretaria de Saúde do Estado. Eu queria apenas que ele desse alguns telefonemas, pois sua dificuldade de locomoção já começava a incomodá-lo mais, embora ele não abrisse mão de suas caminhadas diárias na avenida Peixoto de Castro e ruas próximas. (Isso me faz lembrar o quanto ficava feliz ao vê-lo caminhando com sua bengala, praticamente diariamente, quando ia levar meu filho para a escola, por volta das 7h30 da manhã.)

E não é que ele, no dia seguinte a uma de minhas primeiras visitas, sem me avisar, entrou no ônibus e foi a Taubaté, na Regional de Saúde, para intervir em favor de minha mãe?

Fiquei tão agradecida por seu empenho, pela humanidade diante do momento de sofrimento pelo qual passava nossa família… Tornamo-nos amigos. Passamos a trocar e-mails que já não eram mais apenas profissionais. Falávamos de nossas vidas. Ele me contava sobre sentimentos dele e eu sobre os meus. Pedia, quase sempre, opiniões sobre a minha atuação profissional. Queria saber se minha linha de trabalho correspondia à expectativa de uma das maiores personalidades que esta cidade já conheceu. Embora ele não seja filho de Lorena, sei que é aqui que mora seu coração, onde passou a maior parte da vida, com sua família.

Dos e-mails, a amizade tornou-se presencial. Nossos cafés semanais de final de tarde eram em vários lugares, sempre aconchegantes, e com um grupo que só crescia: no início, éramos eu, ele e sua grande amiga Regina Rousseau. Apresentei a eles a minha amiga Darlene, que apaixonou-se pelos dois instantaneamente. Momentos inesquecíveis, aos quais juntaram-se a nós, por diversas vezes, os queridos Caio de Andrade, Euni, Selise, Tereza Antero… E pronto: nascia o Clube dos Românticos sem Futuro – título dado por ele, que prometeu até criar estatuto, que seria rígido e não permitiria que os encontros deixassem de ser semanais.

Nossos cafés, que duraram cerca de dois anos, fazem falta até hoje… Tivemos que dar fim oficial ao Clube após sua ida definitiva para São Paulo, para estar mais perto dos filhos e netos. Mas sempre nos lembramos dele com muito carinho, quando nos encontramos para cafés eventuais: eu, Regina, Darlene…

Também foi uma grande honra poder ajudar a organizar dois de seus muitos aniversários. Um foi no Café Só Gramas (de 89 anos); eu e Regina estávamos à frente (mais ela do que eu, pois meu tempo era escasso, devido à carga de trabalho). Foi uma festa surpresa que proporcionou a ele – e, claro, a todos nós, seus amigos – momentos felizes inesquecíveis. Na festa de seus 90 anos, infelizmente, não pude ir, por problemas de saúde familiares. Depois, no seu aniversário de 91 anos, também ajudei a Regina a organizar. Outra festa surpresa, desta vez no Clube Comercial. Nestes dois momentos, fui encarregada de ir buscá-lo, sob o pretexto de que tomaríamos mais um de nossos cafés. Acho que ele desconfiava da nossa surpresa nas duas vezes; porém, sendo o “gentleman” que é, jamais nos confessou, creio que tanto para não desmerecer o nosso esforço quanto para não diminuir nossa alegria.

Romântico discreto, pois é um homem extremamente reservado, nunca deixou de acreditar no amor. Certa vez, eu e a Darlene o instigamos a escrever sobre o assunto em sua coluna, embora seu foco sempre fosse a política. Fomos atendidas. No dia 3 de setembro de 2013, recebi a coluna para o Guaypacaré, intitulada: “O amor, ora… o amor”.

No 1º parágrafo, ele já se explicava sobre a mudança de foco: “ Sou cronista, não escritor; registro e gloso acontecimentos e fatos que merecem uma nota, um comentário. Minha sensibilidade para as amenidades, escondo-as cuidadosamente. Porém, recebi, como desafio, sugestão de duas amigas para escrever sobre amor. Pois então lá vai a novidade”.

Nos parágrafos seguintes, explicou sobre os vários significados da palavra, mas focou neste sentimento que acontece entre duas pessoas: “Amar sem ser amado é castigo, humilhação, desespero. Amar sem ser amado nem é amor, é frustração, sofrimento; o amor verdadeiro se expressa em desejo, materialidade, podendo chegar a uma entrega ilimitada – uma outra insanidade quando fora de hora, de tempo e de lugar”.

Finalizou o artigo com questionamentos: “E o amor acaba? Este é o lado triste do amor; acaba por desinteresse de uma das partes da relação, por cansaço mental, decepção, uma traição súbita ou outro acontecimento que demonstra, na prática, que o amor de antes já não existia mais… Vocês já pensaram no amor impossível? Pois ele existe quando condições humanas especiais impedem que um casal se ligue de fato porque um dos pólos da ligação, ou até mesmo ambos, sofrem impedimentos. E daí? Digam-me vocês. Que pensam no assunto…”

Adoramos o texto e tenho certeza de que muita gente também. Ainda sobre o amor, lembro-me de que ele sempre nos dizia que o corpo envelhece, mas a alma não… E eu rebatia dizendo a ele, quando notava sua melancolia, que não existe idade para ser feliz. “A idade de ser feliz é hoje”, repito isso para ele até hoje, pois após sua ida para a capital paulista, trocamos e-mails constantemente. Ele agora é meu colunista, no Portal de Notícias O Lorenense, que fundei seis meses após o falecimento da minha mãe, em 24 de abril de 2014, e o fim do Jornal Guaypacaré, na mesma semana.

Uma honra e um incentivo poder contar com este grande amigo no meu dia a dia, pessoal e profissional, mesmo que agora praticamente apenas pela tela do computador. Hoje, sei que é conhecida e reconhecida sua história na cidade, sua batalha pela educação, pelo bom jornalismo, pela cultura… mas posso afirmar, com toda certeza, que maior toda essa trajetória é o seu grande coração!

A seguir, algumas fotos de momentos especiais:

Inauguraçao DDM

cafe 1

cafe 2

cafe

cafe 4

COLUNISTAS / Nelson Pesciotta

Membro da Academia de Letras de Lorena. Licenciado em Filosofia e Bacharel em Direito, jornalista e sociólogo. Aposentado do Magistério estadual, no qual foi professor, diretor de escola (só no antigo CEEN Arnolfo de Azevedo, atuou durante 15 anos) e supervisor de ensino. No ensino superior, lecionou na Unitau e na antiga Faenquil (hoje EEL-USP), da qual é patrono do Colégio Técnico.  Foi secretário de Educação e Cultura, em Lorena.

Manteve, por mais de 20 anos, coluna semanal no Jornal Guaypacaré.  Promoveu, durante muitos anos, o concurso de declamação Arnolfo Azevedo e outros certames culturais e cívicos.  Foi presidente do Instituto de Estudos Valeparaibanos.  Tem 91 anos de idade.


npesciotta@uol.com.br

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